segunda-feira, 11 de março de 2013

Experiências Pessoais

Olá meus amigos leitores hoje vou postar algo diferente do habitual, tenho em minha posse um depoimento de uma pessoa que me enviou um e-mail desejando compartilhar sua experiência no assunto e também uma entrevista feita com um adicto que se propôs também a relatar sua experiência com a dependência química e sua recuperação. Espero que gostem.

Depoimento da X


Olá Ulysses, meu nome é X e gostaria de compartilhar com você e os leitores do seu blog, minha experiência em relação ao tema (Adicto/co-dependência) resumidamente. Para falar a verdade quando me propus a escrever este depoimento achei que seria fácil, porém tive um pouco de dificuldade de encarar estas questões ou de “me encarar”, mas vamos lá...Nasci numa família bem grande, com vários irmãos e fomos criados entre tios, primos e sobrinhos... Tudo junto e misturado. Para nós a bebida era uma coisa normal, cresci vendo meu pai chegar bêbado e sempre agressivo com a gente e principalmente com a minha mãe! Então beber cedo foi normal para todos nós, eu mesma sempre me relacionei com pessoas que bebiam ou usavam drogas, pessoas não muito carinhosas ou problemáticas ou carentes de alguma forma porque eu só sabia lidar com estas pessoas e me sentia em casa! Quando conheci meu atual relacionamento, começamos a sair, beber e claro, sem muitas surpresas, logo veio a noticia de que ele usava drogas! Que pra mim não foi problema, porque eu achava que sabia lidar com pessoas problemática, neste período tivemos vários afastamentos devido á internações  e recaídas mas eu sempre achava que as coisas um dia iam melhorar, e com isso aceitava o uso de drogas na minha frente e até facilitava para ele o acesso, justamente por falta de conhecimento e por achar que estava o ajudando. Esta situação durou anos até que ele chegou ao fundo do poço dele e com sua própria força hoje esta sem usar há alguns anos! No começo da recuperação dele tive muita dificuldade de lidar com a falta da bebida, das loucuras, pois fazíamos tudo juntos, demorei até entender que também tenho um problema, o que me ajudou muito foi acompanha-lo nas reuniões do NA porque assim pude entender que o vício é uma doença, e fui procurar ajuda em grupo específico para mim o Amor Exigente e NAR-ANON, acredito que quando criamos a consciência e conhecimento do problema fica mais fácil de reagirmos. Tenho dois irmãos alcoólatras e uma irmã que está indo para o mesmo caminho, e se toda minha família criasse esta consciência seria mais fácil ajuda-los. O que percebo é que quanto mais cedo temos contato com drogas/álcool o caminho para eles se torna inevitável e isto é muito real. Obrigada pela ajuda e divulgação do problema que ainda é considerado tabu dentro das famílias.

X – 42 anos
São Paulo

Entrevista com B

ODQ – Bom gostaria que você iniciasse dizendo quem é você, como era sua vida e o que levou você a se interessar pela droga?
B – Meu nome é B, tenho 27 anos e eu sou um adicto em recuperação. Não faço uso de drogas há 3 anos e dois meses. Sou filho único de uma família que sempre considerei normal. Haviam brigas e confusões dentro de casa e eram constantes essas brigas quase sempre por constantemente morar algum parente do meu pai em casa. Essas pessoas bebiam em casa, mas nunca foi de forma abusiva, era mais em festas e não me lembro de algo significativo relacionado a isso. Existia muito abuso verbal, meus pais sempre se ofendiam muito nessas brigas, quebravam coisas em casa, mas nunca se agrediram ou a mim fisicamente. Essas brigas acabaram por me afastar cada vez mais dos dois, sentia raiva tanto da minha mãe quanto do meu pai que já é falecido, sempre havia a eminencia do divorcio, ouvia esse papo pelo menos uma vez ao mês e demorou muito tempo para que isso de fato acontecesse. Como desde cedo tinha muita dificuldade em me aceitar como era um menino tímido, bom aluno e comportado, o sobrinho favorito das minhas tias e aluno favorito das professoras nos primeiros anos na escola, nunca gostei disso, sempre quis ser como um dos meus primos, que aterrorizavam a família quando chegava, eu queria ser assim e com essas brigas constantes minhas insatisfações e decepções comecei a buscar meus heróis em outras figuras, que quase sempre eram vilões, seja na minha rua, na escola, em filmes e na musica, comecei a me interessar pelo errado, pelo mal a torcer para o bandido e não pelo mocinho. Acredito que tenha sido essas coisas que me levaram a ter interesse pela droga.Meu Primeiro contato com a droga foi “mágico”, consegui encontrar exatamente o que buscava, me tirava de minha realidade, alterava minha percepção e de quebra dava um tapa na cara de todos que me achavam “bonzinho”.No inicio eu usava em alguns eventos, para fazer determinadas coisas, depois passei a usar para fazer tudo e terminando parando de fazer tudo e fiquei usando, nunca tive nenhuma descriminação com nenhum tipo de droga.Comecei com o álcool, passei para a maconha, depois parti para a cocaína até chegar ao crack meu fundo de poço.

ODQ - Você passou por algum tipo de tratamento?
B – Passei por uma internação, não por decisão própria, mas por intervenção de minha mãe e minha namorada. Quando disse que estava usando (só eu achava que isso era um segredo), elas ficaram do meu lado e me ofereceram essa oportunidade, uma pessoa ligada a minha namorada, um adicto em recuperação foi até nós para apresentar algumas opções. Apesar de ter resistido e garantido a mim mesmo que não iria usar isso durou poucos dias e tive mesmo de ser internado.

ODQ - Como foi saber que era um adicto/alcoólatra?
B – A princípio é claro que neguei e disse a mim mesmo que era diferente daquelas pessoas que estavam internadas comigo, e que eu não era a pessoa que os terapeutas descreviam, eu na verdade tinha muito medo de viver algo que fosse diferente do que já conhecia. Como eu podia viver sem a coisa mais importante da minha vida? Absurda essa pergunta mais era essa a importância da droga na minha vida, e mais fazia tudo por “só mais uma”. Depois de alguns dias na instituição as coisas foram se acalmando dentro da minha cabeça e comecei a sentir certo alivio em saber que eu não era o mal caráter que imaginava e que muitos falavam que eu era, mas era portador de uma doença física, mental e emocional, a adicção.

ODQ - Você teve alguma recaída?
B – Aceitei apenas algumas coisas, eu não acreditava que álcool fosse um problema para mim, quando sai da internação, por indicação dos terapeutas procurei um grupo anônimo, eu me tornei membro de NA. Fui muito bem recebido e me disseram que eu era a pessoa mais importante na reunião, criei o habito de frequentar as reuniões que me ajudavam muito, mas ainda assim não engolia o papo de “Álcool é droga”, pra mim parecia muito radical e nunca tinha tido problemas com álcool, pelo menos era disso que tentei me convencer, poucos dias depois de sair da internação, na noite de natal, algumas pessoas estavam bebendo na porta da empresa onde trabalhava, eu sabia que deveria passa direto e evitar aquelas pessoas, mas não o fiz parei e acabei bebendo, nos dias seguintes senti muita vontade de usar, mas não usei, então me convenci de que deveria ficar algum tempo sem beber, minha ideia: uns seis meses”. Foi aí que em uma das reuniões de NA ouvi um companheiro partilhando sobre sua experiência, que era alcoólatra e que ficou anos sem beber, frequentando AA, mas passou a usar drogas, logo imaginei o que estava me esperando com esse pensamento de voltar a beber e desde aquele natal eu não uso álcool ou drogas.

ODQ - Como está agora limpo, em recuperação?
B – É uma fase totalmente nova da minha vida, hoje eu tenho a verdadeira liberdade de ser eu mesmo, de não precisar alterar meu humor com nenhuma substancia, para diminuir a dor ou aumentar minha euforia, hoje eu sinto coisas de verdade, meu sorriso e minha lagrima são verdadeiras e espontâneas. Já não passo madrugadas pela rua ou enfiado dentro do meu quarto, trancado e com medo de alguém entrar, esse era meu maior pesadelo, uma prisão que eu havia criado pra mim mesmo, dentro da minha cabeça. Hoje eu sou filho, namorado, profissional, aluno e adicto em recuperação. Experimento todas as coisas que um dia me oferece, sejam elas positivas ou negativas, estou me tornando uma pessoa muito mais feliz do que imaginei que conseguiria, hoje meu mundo não esta mais restrito aquelas ruas, becos e ao meu quarto trancado, hoje eu sou livre para praticar uma maneira totalmente nova de viver e isso é muito gratificante.

ODQ - Como vive seu dia a dia de recuperação?
B – Eu vivo um dia de cada vez e tento manter as coisas simples (o que é bem difícil pra um cara como eu). Frequento reuniões regularmente, fiz novos amigos dentro de NA, pessoas que como eu buscam esse estilo de vida, sem drogas ou álcool, pessoas em recuperação. A maioria das coisas que dão certo são as que disseram no inicio do meu processo de recuperação e que trago até hoje em minha vida, eu evito pessoas, lugares e hábitos da época em que usava, qualquer coisa que possa me levar de volta ao uso eu afasto e mantenho longe da minha vida. Tenho um padrinho, que é alguém com maior experiência que a minha e que me ajuda a trabalhar o programa de NA. Hoje eu sirvo a irmandade de Narcóticos Anônimos e levo a mensagem a outros adictos que ainda sofrem nos horrores da adicção, a mensagem é “Um adicto, qualquer adicto, pode parar de usar, perder o desejo de usar e encontrar uma nova forma de vida”. Todos os dias eu tento ser mais honesto, principalmente comigo mesmo, mais paciente com as pessoas com quem eu convivo ser menos egoísta e claro não uso haja o que houver! Esse programa de NA me deu uma nova visão do que é a vida e de como eu de fato quero vive-la e só por hoje vem dando certo, trabalho, namoro e melhorei meu relacionamento com minha família principalmente minha mãe. Hoje eu tenho vontade de viver e não de usar que para mim é a morte, mesmo que eu continue vivo.

ODQ - o que gostaria de falar sobre você ou qual mensagem gostaria de passar para as pessoas?
B – Que a recuperação é possível e que existem muitos meios de se chegar a ela, o que relatei foi o que deu certo pra mime vem funcionando para milhares de outras pessoas, centenas eu conheço pessoalmente e tenho certeza que falariam algo muito parecido com o que te disse. Nós realmente nos recuperamos e só por hoje eu não vou usar e vou ser muito feliz.

B – 27 anos
São Paulo

Considerações Finais

Observando tanto o relato de X como a entrevista de B fica claro que o ambiente familiar disfuncional colabora em muito para a vivência da experiência com a dependência química.
As famílias que tem por costume o consumo de álcool seja social ou não induzem á criança a esse mundo, pois a criança aprende observando os pais e os mais velhos e entende que ela beber vai fazer dela um "adulto".
Em ambientes de violência (verbal e/ou física) por motivação de álcool ou não a tendência dessa criança ou adolescente enxergar a vida através das ações de seus pais ou dos mais velhos é muito grande, passa a pensar que isso é assim mesmo e depois com passa a repetir esses padrões nas suas vidas pois a repetição é o forma primária de aprendizado do ser humano e se manifesta de forma instintiva nas pessoas.
Essa repetição fez com que X buscasse em seus relacionamentos pessoais, pessoas parecidas com a de seu lar por se tratar de algo que ela já conhecia e pensava saber lidar.
Para B não foi muito diferente com a visual desilusão com seus heróis (pai e mãe) passou a se interessar pelo ruim por achar que essa era sua melhor escolha e quanto mais se encontrou ali mais fácil era de suportar aquila realidade.

Agradeço imensamente a colaboração de X e B creio ter sido de muita importância para os leitores do blog. Obrigado por compartilhar suas vivências e desejo não só a vocês mas a todos muitas alegrias em suas jornadas pessoais.
Recuperação a todos!

Boa semana a todos e até o próximo post.

OBS: Por favor não deixe de comentar é muito importante seu retorno.



Nenhum comentário:

Postar um comentário